sexta-feira, 29 de maio de 2009

A Pluralidade das existências

O dogma da reencarnação, dizem certas pessoas, não é novo, pois foi tomado de Pitágoras. Jamais dissemos que a Doutrina Espírita é invenção moderna; o Espiritismo, decorrendo de uma lei natural deve existir desde a origem dos tempos e nos esforçamos sempre em provar que se encontram traços dele desde a mais alta antiguidade. Pitágoras, como sabemos, não é o autor do sistema da metempsicose, pois o tomou dos filósofos indianos e dos meios egípcios, onde existiu desde tempos imemoriais. A idéia da transmigração das almas era, pois, uma crença comum, admitida pelos homens mais eminentes. Por que meio chegou até eles? Pela revelação ou pela intuição? Não sabemos, porém, qualquer que seja, uma idéia não atravessa os tempos e é aceita por inteligências destacadas, sem ter um lado sério. A antiguidade dessa doutrina seria, pois, antes uma prova que uma objeção. Todavia, como se sabe igualmente, há entre a metempsicose dos antigos e a doutrina moderna da reencarnação, esta grande diferença que os espíritos rejeitam de maneira absoluta: a transmigração da alma do homem para os animais e dos animais para o homem.

Allan Kardec

quinta-feira, 28 de maio de 2009

A Cepa simbólica

"Coloca na cabeça do livro a cepa de vinha que te desenhamos (a cepa acima é o fac-símile daquela que foi desenhada pelos Espíritos), porque ela é o emblema do trabalho do Criador; todos os princípios que podem melhor representar o corpo e o espírito nela se encontram reunidos: o corpo é a cepa; o espírito é o licor; a alma ou o espírito unido à matéria é o grão. O homem quintessencia o espírito pelo trabalho e tu sabes que não é senão pelo trabalho do corpo que o espírito adquire conhecimentos."

Instruções dos Espíritos à Allan Kardec

A Seriedade e o Bom Humor

Uma das conquistas mais difíceis do Espírito, ao longo da sua trajetória evolutiva, é a integração das duas virtudes que servem de título a esta crônica.
A seriedade e o bom humor costumam aparecer na intimidade mental de forma mutuamente excludentes quando, no fundo, são traços de personalidade que se completam no processo de nosso definitivo aperfeiçoamento.
Via de regra a seriedade expressa-se na disposição de ânimo para considerar todas as coisas da vida como realmente importantes, dignas de criterioso julgamento, qualquer que seja o modo de se afigurarem ou a maneira de serem interpretadas. Já o bom humor se manifesta como na inclinação para encarar todos os fatos deste mundo com natural contentamento, ainda que os mesmos se mostrem à primeira vista um tanto desagradáveis.
No geral a seriedade chega primeiro à consciência do ser humano esclarecido. Ainda bem, Porque sem ela estacionamos na sombra da irresponsabilidade, pagando cedo ou tarde o preço alto do sofrimento por atitudes descuidosas e procedimentos levianos. Sabemos todos disso, nós espíritas, e aliás a respeito de tal verdade podemos ficar tranquilos, pois somos, essencialmente, pessoas sérias, em que pesem os deploráveis defeitos dos quais continuamos lutando para nos libertar.
O bom humor, porém, é uma aquisição que às vezes custa deveras a ser incorporada em nossa estrutura de caráter. Infelizmente, porque sem eles mergulhamos, em repetidas ocasiões, nas águas turvas de ressentimentos perturbadores, nadando contra a maré do destino.
Necessitamos ser alegres e amáveis. Nenhuma justificativa temos para assumir ares taciturnos, sobretudo nas relações interpessoais, dentro e fora do âmbito espiritista. A fé que abraçamos, racional e lógica, não aprova posturas místicas e alienadas da realidade social, tanto mais saudável quanto espontânea e feliz.
Aprendamos com os nossos maiores. Allan Kardec e Léon Denis, por exemplo, de quem estão vulgarizadas no Brasil fotografias pouco simpáticas, projetando uma aparência quase soturna, foram homens bem-humorados, embora superlativamente sérios.
Gaston Luce, que conheceu ambos de perto, relatando uma palestra de Kardec em Tourane diz que quando o codificador falava sobre obsessão "foram feitas perguntas às quais respondia com fisionomia sorridente". (1) Logo a seguir, acrescenta:

"No dia seguinte, retornei à Spirite-Ville para fazer uma visita ao Mestre; encontrei-o sobre um pequeno banco, junto a uma grande cerejeira, colhendo frutos que jogava para a Sra. Allan Kardec - cena bucólica que contrastava alegremente com esses graves acontecimentos." (2)

Afirma mais Gaston Luce, de Léon Denis, que:

"sua pontualidade no serviço e o escrupuloso cuidado em executar as ordens não alteravam de forma alguma a simplicidade de suas maneiras, sua urbanidade sorridente, seu humor inalterável, apimentado com uma ponta de malícia gaulesa de cunho muito pessoal". (3)

O próprio Allan Kardec, em uma de suas obras básicas da Codificação, oferta-nos este delicioso apontamento:

"Nem sempre basta que uma assembleia seja séria, para receber comunicações de ordem elevada. Há pessoas que nunca riem e cujo coração, nem por isso, é puro." (4)

Como se vê, a seriedade e o bom humor, ao invés de coexistirem como elementos antagônicos na química do crescimento espiritual, são preciosos fios enlaçando a inteligência e o coração no tecido que veste as almas de escol.

(1) LÉON DENIS, O APÓSTOLO DO ESPIRITISMO, de Gaston Luce, tradução de José Jorge, pág. 27 - Edição do Centro Espírita Léon Denis, Rio de Janeiro, agosto de 1989.
(2) Ibidem.
(3) Ib. pág. 28.
(4) O LIVRO DOS MÉDIUNS, de Allan Kardec, Capítulo XXI, Item 233 - Edição da FEB.

Nazareno Tourinho

A Objetividade do Espiritismo

Podemos representar o Espiritismo como um aeronave, pois ele possui corpo central, a filosofia, duas asas, a ciência e a religião, em perfeito equilíbrio, e um leme, o bom senso.
Conhecemos fartamente os três primeiros elementos constitutivos do providencial avião mas pouco nos apercebemos do quarto, o leme, talvez porque em figuração física seja de tamanho menor e menos saliente. Nem por isso tem sua importância reduzida.
Sem bom senso não há Espiritismo e, se há, sua viagem pelo ( ou para o) céu do nosso destino sai da rota certa, perde a direção acabando em desastre, cedo ou tarde. É o que acontece quando a Doutrina se vê pilotada por adepto amante de piruetas, que não consulta os instrumentos de bordo nem respeita as condições meteorológicas do espaço humano.
Allan Kardec, cognominado de bom senso encarnado, conclui o Capítulo IV, Primeira Parte, de "O Livro dos Médiuns", intitulado Dos Sistemas, com estas sábias e ainda hoje oportunas palavras:

"Assim, Espíritos, que podemos considerar adiantados ainda não conseguiram sondar a natureza da alma. Como poderíamos nós fazê-lo? É, portanto, perder tempo querer perscrutar o princípio das coisas que, como foi dito em O Livro dos Espíritos (n°s 17 e 49), está nos segredos de Deus. Pretender esquadrinhar, com o auxílio do Espiritismo, o que escapa à alçada da Humanidade, é desviá-lo do seu verdadeiro objetivo, é fazer como a criança que quisesse saber tanto quanto o velho. Aplique o homem o Espiritismo em aperfeiçoar-se moralmente, eis o essencial. O mais não passa de curiosidade estéril e muitas vezes orgulhosa, cuja satisfação não o faria adiantar-se um passo . O único meio de nos adiantarmos consiste em nos tornarmos melhores. Os Espíritos que ditaram o livro que lhes traz o nome demonstraram a sua sabedoria, mantendo-se, pelo que concerne ao princípio das coisas, dentro dos limites que Deus não permite sejam ultrapassados e deixando aos Espíritos sistemáticos e presunçosos a responsabilidade das teorias prematuras e errôneas, mais sedutoras do que sólidas, e que um dia virão a cair, ante a razão, como tantas outras surgidas dos cérebros humanos. Eles, ao justo, só disseram o que era preciso para que o homem compreendesse o futuro que o aguarda e para, por essa maneira, animá-lo à prática do bem."

Aí está desenhado, em tintas vivas, o caráter objetivo de nossa Doutrina, concebida pelos Espíritos Superiores para ofertar à Humanidade orientações educativas e não especulações inconsequentes como o fazem tantas outras filosofias paralelas, as quais, intentando voar mais alto para devassar nuvens coloridas de verdades transcendentes, terminam esgotando o combustível da lógica nas zonas de turbulência da ilusão.

Nazareno Tourinho

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Jung e o Pós-morte

Ao menos uma parte de nossa existência psíquica se caracteriza por uma relatividade de espaço e de tempo. À medida que nos afastamos da consciência, esta relatividade parece elevar-se até ao não-especial e a uma intemporalidade absolutas. As figuras do inconsciente são também "ininformadas" e têm necessidade do homem ou do contato com a consciência para adquirir o saber. Parece, com efeito, que um saber sem limites está presente na natureza, mas que tal saber não pode ser apreendido pela consciência a não ser que as condições temporais lhe sejam propícias. O mesmo ocorre provavelmente na alma do indivíduo que traz consigo, durante anos, certos pressentimentos, mas só os conscientiza tempos depois.

Quando escrevi os Septem Sermones ad Mortuos, foram novamente os mortos que me propuseram questões cruciais. Voltavam – diziam eles – de Jerusalém porque não tinham encontrado o que procuravam. Isso me espantou muito nessa época porque, de acordo com a opinião tradicional, são os mortos que possuem o grande saber; com efeito, devido à doutrina cristã que supõe que no além olharemos as coisas face a face, a opinião acatada é que os mortos sabem mais do que nós: mas, aparentemente, as almas dos mortos só "sabem" o que sabiam no momento da morte e nada mais. Daí seus esforços para penetrar na vida, para participar do saber dos homens. Freqüentemente tenho a sensação de que elas se colocam diretamente atrás de nós, na expectativa de perceber que respostas daremos a ela e ao destino. Parece-me que o que lhe importa a todo custo é receber dos vivos – isto é, daqueles que lhes sobreviveram e que permanecem num mundo que continua a se transformar – respostas às suas questões. Os mortos questionam como se não tivessem a possibilidade de saber tudo, como se a onisciência ou a oniconsciência apenas pudesse ser privilégio da alma encarnada num corpo que vive. Tam bém o espírito dos vivos parece, pelo menos num ponto, avantajar-se ao dos mortos: a aptidão em adquirir conhecimentos nítidos e decisivos. O mundo tridimensional, no tempo e no espaço, parece-me um sistema de coordenadas: o que se decompõe aqui em ordenadas e abscissas, "lá", fora do tempo e do espaço, pode aparecer talvez como uma imagem original de múltiplos aspectos ou talvez como uma nuvem difusa de conhecimentos em torno de um arquétipo. Mas um sistema de coordenadas é necessário para poder distinguir conteúdos distintos. Tal operação nos parece inconcebível num estado de onisciência difusa ou de uma consciência carente de sujeito, sem determinações espaço-temporais. O conhecimento, como a geração, pressupõe um contraste, um "cá" e um "lá", um "alto" e um "baixo", um "antes" e um "depois".

Se há uma existência consciente após a morte, parece-me que ela se situaria na mesma direção que a consciência da humanidade, que possui em cada época um limite superior mas variável. Muitos seres humanos, no momento de sua morte, não só ficaram aquém de suas próprias possibilidades, mas sobretudo muito distantes daquilo que outros homens ainda em vida tornaram consciente, daí sua reivindicação de adquirir, na morte, esta parte da consciência que não adquiriram em vida.

O grau de consciência atingido, qualquer que seja ele, constitui, ao que me parece, o limite superior do conhecimento ao qual os mortos podem aceder. Daí a grande significação da vida terrestre e o valor considerável daquilo que o homem leva daqui "para o outro lado" no momento de sua morte. É somente aqui, na vida terrestre, em que se chocam os contrários, que o nível da consciência pode elevar-se. Essa parece ser a tarefa metafísica do homem – mas sem mythologein (mitologizar) apenas pode cumpri-la parcialmente. O mito é o degrau intermediário inevitável entre o inconsciente e o consciente. Está estabelecido que o inconsciente sabe mais que o consciente, mas seu saber é de uma essência particular, de um saber eterno que, freqüentemente, não tem nenhuma ligação com o "aqui" e o "agora" e não leva absolutamente em conta a linguagem que fala nosso intelecto. Somente quando damos às suas afirmações a oportunidade de "amplificar-se", através dos números, é que este saber do inconsciente penetra no domínio de nossa compreensão, tornando possível a percepção de um novo aspecto. Este processo se repete de maneira convincente em todas as análises de sonhos bem sucedidas.


Um mito muito divulgado sobre o além é constituído por idéias e representações a respeito da reencarnação. Num país em que a cultura espiritual é muito diferente e muito mais antiga do que a nossa, como a Índia, a idéia da reencarnação é, por assim dizer, natural e tão espontânea como entre nós a idéia de que Deus criou o mundo ou a existêncla de um spiritus rector (espírito diretor), de uma providência. De acordo com as características espirituais do oriental, a sucessão de nascimento e morte é considerada como um desenrolar sem fim, como uma roda eterna que gira sempre sem objetivo. Vivemos, discernimos; morremos e recomeçamos do início. Foi somente com Buda que aparece a idéia de um objetivo: o de superar a existência terrestre.

A necessidade mítica do homem ocidental exige a imagem de um mundo em evolução, que tenha um começo e um objetivo. O ocidental rejeita a imagem de um mundo que tenha um começo e um simples fim, da mesma forma que repele a representação de um ciclo estático eterno, fechado sobre si mesmo. O oriental, pelo contrário, parece poder tolerar essa idéia. Não há, evidentemente, consenso geral sobre qual seja a essência do mundo e os próprios astrônomos não puderam ainda chegar a um acordo a respeito desta questão. Ao homem do Ocidente o absurdo de um universo simplesmente estático é intolerável. É preciso pressupor-lhe um sentido. O oriental não tem necessidade alguma de tal pressuposto, pois que ele incorpora esse sentido. Enquanto o ocidental quer completar o sentido do mundo, o oriental esforça-se por realizar esse sentido no homem, despojando-se ele mesmo do mundo e da existência (Buda).

Eu daria razão tanto a um como a outro. Porque o ocidental me parece sobretudo extrovertido e o oriental introvertido. O primeiro projeta o sentido, isto é, coloca-o nos objetos; o segundo sente-o em si mesmo. Ora, o sentido porém está tanto no exterior como no interior. Não se pode separar a idéia da reencarnação da idéia do karma. A questão decisiva é saber se o karma de um ser humano é ou não pessoal. Se o destino preestabelecido com que um ser humano entra na vida é o resultado de ações e realizações das vidas anteriores, existe então uma continuidade pessoal. Na outra hipótese, um karma é, por assim dizer, apreendido por ocasião do nascimento; incorpora-se novamente sem que haja uma continuidade pessoal.

Duas vezes os discípulos perguntaram a Buda se o karma do homem era pessoal ou impessoal. Duas vezes ele se esquivou a responder evitando comprometer-se: conhecer a resposta, disse, não contribuiria para libertar o homem da ilusão do ser. Buda considerava que lhes era mais útil meditar sobre a cadeia dos nidanas, isto é, nascimento, vida, velhice e morte, causa e efeito dos acontecimentos dolorosos.

Não sei responder se o karma que vivo é o resultado de minhas vidas passadas, ou uma aquisição de meus ancestrais, cuja herança se condensou em mim. Serei, por acaso, uma combinação de vidas ancestrais e será que reencarno de novo essas vidas? Terei vivido, antes, como personalidade determinada e terei progredido o suficiente nessa vida ulterior para poder agora esboçar uma solução? Eu o ignoro. Buda não respondeu à pergunta e posso supor que ele próprio não tinha certeza.

Posso facilmente imaginar que já vivi em séculos anteriores e ao deparar com perguntas a que ainda não posso responder, supor que me é necessário nascer novamente, por não ter completado a tarefa que me foi imposta. Quando morrer meus atos me seguirão. É, pelo menos, o que imagino. Levarei comigo o que fiz, tendo a esperança, contudo, de não chegar ao fim de meus dias com as mãos vazias. Buda parece ter pensado assim quando procurava afastar seus discípulos de especulações inúteis.

Se admitirmos que há uma continuação no "além", só poderemos conceber um modo de existência que seja psíquico, pois a vida da psique não tem necessidade de espaço ou tempo. A existência psíquica – e sobretudo as imagens interiores de que nos ocupamos desde agora – oferecem matéria para todas as especulações míticas sobre uma vida no além, e esta eu a represento como um caminhar progressivo através do mundo das imagens. Desse modo a psique poderia ser essa existência na qual se situa o "além" ou o "país dos mortos". Inconsciente e "país dos mortos" seriam, nessa perspectiva, sinônimos.

Acho provável que existam igualmente no além certas limitações; mas as almas dos mortos só descobrem progressivamente onde residem os limites do estado de libertação. Em algum lugar, "lá", reina uma necessidade imperiosa que condiciona o mundo e quer pôr um termo ao estado de existência no além. Esta necessidade criadora decidirá – assim penso – quais as almas que serão de novo mergulhadas na encarnação e no nascimento. Eu poderia imaginar que para algumas almas o estado de existência tridimensional seria mais feliz do que o estado "eterno". Mas isso dependerá talvez do que elas tenham levado consigo como soma de perfeição ou de imperfeição de sua existência humana.

Pode ser que uma continuação da vida tridimensional não tenha mais nenhum sentido, uma vez que a alma tenha atingido certos degraus de inteligência; que esteja liberta da necessidade de retornar à Terra e que uma compreensão superior suprima o desejo de ver-se reencarnada. Então a alma escaparia ao mundo tridimensional e atingiria o estado a que os budistas chamam de Nirvana. Mas se ainda há um karma que deva ser cumprido, a alma recai no mundo dos desejos e retorna novamente à vida, talvez sabendo mesmo que falta alguma coisa para cumprir.

Não somos, de forma alguma, capazes de demonstrar que qualquer coisa de nós se conserva eternamente. Tudo o que podemos dizer é que existe uma certa probabilidade de que alguma coisa se conserve além da morte física. E o que continua a existir é em si mesmo consciente? Também não o sabemos. Se tivermos a necessidade de opinar sobre esse assunto, talvez possamos levar em consideração aquilo que é conhecido nos fenômenos de dissociação psíquica. Com efeito, na maior parte dos casos em que se manifesta um complexo autônomo, ele aparece sob a forma de uma personalidade, como se o complexo tivesse consciência de si próprio. É por este motivo que as vozes dos doentes mentais são personificadas. Este fenômeno do complexo personificado, eu o estudei em minha tese. Poder-se-ia, se quiséssemos, invocar tal fato em favor de uma continuidade da consciência. Em favor desta hipótese, podemos citar as surpreendentes observações feitas quando ocorrem graves colapsos ou desmaios profundos, oriundos de lesões agudas do cérebro. Nos dois casos pode haver percepções do mundo exterior, assim como intensos fenômenos oníricos, mesmo que se trate de uma profunda perda de consciência. Como a superficie cerebral, que é a sede da consciência, é posta fora de circuito durante a síncope, estes fenômenos ainda hoje permanecem inexplicáveis. Eles poderiam testemunhar em favor de uma conservação, pelo menos subjetiva, da aptidão da consciência – mesmo no estado de aparente inconsciência.
Carl Gustav Jung

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Honras Vãs

"Em vão, porém, me honram, ensinando doutrinas que são mandamentos de homens."

- Jesus (MARCOS, 7:7.)

A atualidade do Cristianismo oferece-nos lições profundas, relativamente à declaração acima mencionada.

Ninguém duvida do sopro cristão que anima a civilização do Ocidente. Cumpre notar, contudo, que a essência cristã, em seus institutos, não passou de sopro, sem renovações substanciais, porque, logo após o ministério divino do Mestre, vieram os homens que lavraram ordenações e decretos na presunção de honrar o Cristo, semeando, em verdade, separatismo e destruição.

Os últimos séculos estão cheios de figuras notáveis de reis, de religiosos e políticos que se afirmaram defensores do Cristianismo e apóstolos de suas luzes.

Todos eles escreveram ou ensinaram em nome de Jesus.

Os príncipes expediram mandamentos famosos, os clérigos publicaram bulas e compêndios, os administradores organizaram leis célebres. No entanto, em vão procuraram honrar o Salvador, ensinando doutrinas que são caprichos humanos, porquanto o mundo de agora ainda é campo de batalha de idéias, qual no tempo em que o Cristo veio pessoalmente a nós apenas com a diferença de que o Farisaísmo, o Templo, o Sinédrio, o Pretório e a Corte de César possuem hoje outros nomes. Importa reconhecer, desse modo, que, sobre o esforço de tantos anos, é necessário renovar a compreensão geral e servir ao Senhor, não segundo os homens, mas de acordo com os seus próprios ensinamentos.

Emmanuel

Frutos

“Portanto, pelos seus frutos os conhecereis.”

— Jesus. (MATEUS. Capítulo 7, versículo 20.) O mundo atual, em suas elevadas características de inteligência, reclama frutos para examinar as sementes dos princípios. O cristão, em razão disso, necessita aprender com a boa árvore que recebe os elementos da Pro­vidência Divina, através da seiva, e converte-os em utilidades para as criaturas. Convém o esforço de auto-análise, a fim de iden­tificarmos a qualidade das próprias ações. Muitas palavras sonoras proporcionam simples­mente a impressão daquela figueira condenada.

É indispensável conhecermos os frutos de nossa vida, de modo a saber se beneficiam os nossos irmãos. A vida terrestre representa oportunidade vastís­sima, cheia de portas e horizontes para a eterna luz. Em seus círculos, pode o homem receber diariamente a seiva do Alto, transformando-a em frutos de natu­reza divina. Indiscutivelmente, a atualidade reclama ensinos edificantes, mas nada compreenderá sem demonstra­ções práticas, mesmo porque, desde a antigüidade, considera a sabedoria que a realização mais difícil do homem, na esfera carnal, é viver e morrer fiel ao supremo bem.


Emmanuel